A Estância
Um documento, recebido por Edmond Berchon des Essarts, tataravô de Anna Luiza Berchon des Essarts Sampaio Quinto di Cameli, é uma das muitas relíquias que resgatam a tradição da família. A atual proprietária da Estância da Gruta destaca que é uma entre muitas lembranças que têm o cuidado de conservar, catalogar e que merecem figurar publicados, como registros da história do Rio Grande do Sul.
“Eu, o Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil, vos envio muito saudar. Attendendo aos serviços que prestastes a este Império e Querendo hum testemunho da Minha Imperial consideração: Hei por bem Nomear-vos Cavalleiro da Ordem de Christo. E Nosso Senhor Tenha em Sua Santa Guarda. Escripto no Palácio do Rio de Janeiro, em dezessete de Novembro de mil oitocentos e sessenta e nove, quadragésimo oitavo da Independência do Império.
Palácio de São Cristovão.
Para Edmond Berchon Des Essarts.
Súbdito de Sua Majestade o Imperador dos Franceses.”
A Estância da Gruta está situada próxima da cidade de Pelotas, no município de Capão do Leão, no distrito denominado Pavão. Lá estão as terras da sesmaria, compreendidas entre os rios Contrabandista e Piratini, entregues em 1777 ao sargento-Mor Roberto Roiz, mais tarde transferidas ao seu genro, Domingos de Castro Antiqueira – barão e visconde de Jaguari, casado com Maria Joaquina de Castro.
Setenta e um anos após, Antônio José Gonçalves Chaves, poderoso charqueador pelotense, viajado e um homem adiantado para a época – expressava sua oposição à escravidão, apresentando suas ideias em discursos e escritos em que defendia também a distribuição de terras e o fim das Capitanias, adquiriu a sesmaria dos descendentes de Roiz em 1848. Nela, uma das herdeiras, de nome Bernardina, fez edificar, em 1853, a sede atual da Estância da Gruta. O casario tem, rigorosamente conservadas, desde as paredes de 60 centímetros feitas de adobe, até as aberturas e os vidros das portas e janelas, instalados no período de construção.
A transferência da propriedade, pelos herdeiros do barão e visconde de Jaguari para Antônio José Gonçalves Chaves, está associada à trágica extinção da descendência de Domingos Antiquera. Sua bisneta, de nome Maria, por ter contrariado os amores do filho, Vicentinho, acabou falecendo solitária na fazenda. Conta-se que, ao retornar de um passeio a cavalo, o rapaz, de 23 anos, encontrou a amada morta no pátio da casa. Desesperado, atirou-se ao arroio e afogou-se.
Os herdeiros legais, sobrinhos de Maria, venderam as terras à família que até hoje detém a propriedade, pois Antonia, filha do comprador, Antônio José Gonçalves Chaves, casou-se com o médico Edmond Berchon des Essarts. Quarenta anos depois, em 1888, Berchon, comprou as terras dos outros herdeiros e refez a sesmaria, incluindo a Estância da Gruta.
O ano de 1915, em plena 1ª Guerra Mundial, é uma data marcante na história da Estância da Gruta. Foi quando teve origem a criação do gado Devon. Dr. Friesh, zootecnista inglês, dono da Cabanha Lorena no Uruguai, vendeu todo o seu rebanho para o Dr. Edmundo Berchon des Essarts e seu grande amigo Dr. Francisco de Assis Brasil, que além de ter sido diplomata e embaixador do Brasil na Inglaterra, era homem de muita vivência no campo. Ele percebeu que as pastagens e as condições climáticas do condado de Devon, eram muito semelhantes às do Rio Grande do Sul. A raça Devon demonstrou sua perfeita adaptação no pampa gaúcho. Dr. Berchon passou então a importar o que havia de melhor de touros e vacas Devon na Inglaterra. Na década de 1986, a Estância da Gruta chegou a deter o maior rebanho da raça pura no mundo.
Foi a partir de 1993, que a Gruta implantou o sistema de franquia para produção do Composto Montana, uma nova raça, baseada em um sistema genético sério, de princípios comprovados e economicamente lucrativos. O cultivo de arroz é mais uma atividade na qual empreende a atual dona da propriedade: a bisneta do Dr. Edmundo Berchon, a engenheira-agrônoma Anna Luiza Berchon des Essarts Sampaio Quinto di Cameli.
O gado inovador e de origem 100% brasileira foi desenvolvido com foco na melhor adaptação ao clima e maior rendimento advindos da heterose. O primeiro contato com a Montana foi por meio do criador Jim Leechman, que se interessou por usar a genética das fêmeas Devon da Gruta para criar o seu composto. Após uma viagem ao Centro Genético de Nebaska, nos Estados Unidos, Anna Luiza voltou convencida que o cruzamento com composto era a força que faltava para acelerar o processo de melhoramento de rebanhos focados em qualidade de carne.
A Estância da Gruta permanece há mais de 150 anos sendo uma referência em estabelecimento agro-pastoril. Atualmente, na sua sexta geração, através do trabalho empenhado de Antônio José, sétima geração, a propriedade segue fiel às suas origens, à tradição e sempre amparada em tecnologia de ponta. Mais do que uma força do agronegócio gaúcho, a Gruta também é uma ode à cultura. Com estruturas do século XIX, a estância reúne o antigo casarão, capela e as memórias de todas as gerações que por ali passaram. Por sua estrutura preservada, foi cenário para gravação de filmes e minisséries de época.